Com tecnologia e cúrcuma, o estudo propõe uma abordagem melhorada para inflamações intestinais e para os efeitos colaterais dos tratamentos disponíveis
Tárcila Cabral – texto
Deriky Pereira – fotos
A Fapeal tem instituído chamadas com o objetivo de provocar uma interação entre a academia e sociedade, para fortalecer ainda mais esta associação. Integrando este propósito de articular os setores, os Programas de Pós-Graduação (PPGs) estão recebendo investimentos direcionados a estudos substanciais.
Um reflexo da junção destes mundos é o grupo de pesquisa liderado pela professora Marília Goulart no Laboratório de Eletroquímica e Estresse Oxidativo (LEEO) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). A equipe gerida por ela recentemente desenvolveu duas pesquisas com o apoio da Fapeal, buscando promover iniciativas que lidam com as carências locais. A primeira análise estudou a doença dos rins diabéticos (nefropatia), correlacionada ao estado nutricional de paciente. Já a segunda, está em sua fase final e verifica os efeitos da suplementação da cúrcuma em portadores de doenças inflamatórias intestinais.
O grupo recebeu um financiamento de mais de R$200 mil, e estruturou o projeto no PPG da Rede Nordeste de Biotecnologia (Renorbio) elaborando aplicações de alto nível científico.
A cúrcuma longa, em sua forma de extrato farmacêutico, consegue melhorar ou diminuir os efeitos das doenças inflamatório-intestinais no organismo. Normalmente, diagnósticos como Doença de Crohn (DC) e Colite Ulcerativa Idiopática (CUI) frequentemente são acompanhados de efeitos colaterais a partir dos medicamentos utilizados no tratamento dos pacientes.
“A nossa suplementação não deve substituir nenhum medicamento, mas ser associada ao tratamento para contribuir e possibilitar ao paciente maior qualidade de vida”, frisa a nutricionista do grupo. Fabiana Moura segue explicando que a pesquisa utiliza alguns marcadores para analisar os processos inflamatórios de estresse oxidativo e glicoxidação.
O estresse oxidativo é conhecido como o envelhecimento dos órgãos e à medida que certos distúrbios se instalam o processo pode ser acelerado, dificultando assim suas atividades. Com menos funções sendo realizadas de forma adequada os órgãos começam a falhar, mas o estudo se propõe a auxiliar um equilíbrio intestinal, onde as atividades ocorram normalmente.
No início da pesquisa alguns testes foram realizados com os produtos naturais pesquisados por Jadriane Xavier, que já trabalha identificando estas substâncias desde a sua Iniciação Científica. A doutora em química e biotecnologia analisou muitos destes produtos no projeto.
Para a condução do estudo em laboratório foi desenvolvida uma espécie de triagem, até encontrar a substância que melhor desempenhasse o papel químico desejado pelo grupo.
O que mais se adequou foi a cúrcuma longa, a princípio estudada em modelo animal. Como os resultados foram relevantes, a proposta passou a ser empregada em humanos, o que oportunizou o desenvolvimento do projeto de doutorado da aluna Amylly Martins, integrante da equipe.
O estudo passa agora a observar essa elaboração tanto dos produtos que levam ao envelhecimento precoce dos órgãos, como também aqueles que levam à inflamação, porque uma coisa está ligada a outra. Quando se possui um estresse se possui uma inflamação, portanto será determinado se o emprego da cúrcuma nesses pacientes consegue reduzir a inflamação e aperfeiçoar a função dos tecidos e órgãos.
Potencialidade da cúrcuma
“Nós trabalhamos com diversos tipos de produtos naturais e outra pesquisadora do doutorado acabou aplicando a curcumina em suas análises. Ela fez testes iniciais antioxidante e antiglicante e pôde ver o quanto que a curcumina controlava este desequilíbrio”, explica Jadriane Xavier. A descoberta conseguiu ser implementada definitivamente com a viagem das pesquisadoras a Portugal. Através do apoio da Fapeal, as cientistas se encaminharam até a Universidade do Porto, para compreender as técnicas referência da área utilizadas na Faculdade de Farmácia da instituição, trazendo na bagagem procedimentos que auxiliaram o processo da pesquisa, para serem implantados no programa da Renorbio.
Os investimentos depositados pela Fapeal continuaram instrumentais para o desenrolar do projeto. A instituição investiu no estudo através do auxílio financeiro e por meio da bolsa fornecida a estudante de doutorado Samara Bomfim. Assim além dos materiais de laboratório, as pesquisadoras puderam comprar equipamentos, notebooks, softwares, placas, entre outros itens.
A última adição da pesquisa foi a compra do equipamento de bioimpedância. Esta ferramenta é utilizada para realizar a avaliação da composição corporal dos pacientes, alcançando variáveis que podem obter uma visão mais precisa. Os resultados científicos reproduzidos com o aparelho são de ponta, sendo desenvolvidos nos melhores centros do mundo. Pois se o estudo continuasse a empregar a máquina simples para obter a bioimpedância, não se obteriam tantos resultados comparativos.
Os índices acabam se mostrando afetados porque pode se estar com o peso adequado, mas com uma composição corporal de gordura maior e quantidade inferior de músculos. Isto é muito comum em pacientes que estão inflamados, então mesmo apresentando um peso adequado estas pessoas podem estar desnutridas ou com excesso de tecido adiposo, e isto a bioimpedância consegue detectar precisamente. O maior problema observado hoje no emprego de outros métodos é o diagnóstico equivocado, sem rigor.
O novo equipamento funciona corretamente, pois ele é tetrapolar, ou seja, possui ao todo quatro eletrodos conectados as palmas das mãos e nas pontas dos pés, e são dois eletrodos em cada membro. Quando a máquina está conectada ao paciente ela emite uma corrente elétrica ao longo de todo o corpo, questões que outras bioimpedâncias não fazem, por isso não possuem uma composição fidedigna real. A partir do funcionamento, o procedimento fornecerá uma estrutura exata sobre o quanto de água, massa gorda, massa magra e fatores específicos que o paciente apresenta exatamente. Estas informações são preciosas para a pesquisa.
Funções da pesquisa
Pensando numa execução social aplicada ao estudo, a bolsista de doutorado da Fapeal, Samara, explica que possui uma visão da devolutiva para a sociedade.
Ela enxerga a cúrcuma num ponto de vista não apenas de tratamento, mas de sustentabilidade para as comunidades nordestinas que podem estar se beneficiando do cultivo desse extrato, que é inicialmente obtido como raiz da cúrcuma. Produzindo este alimento, que possui um potencial terapêutico e é abundante na região, é algo a se pensar também ao setor empreendedor, cita a acadêmica. O projeto beneficia a saúde pública, mas movimenta o fator econômico de desenvolvimento também.
Outra condição importante listada pela também bolsista Amylly, é com relação às doenças inflamatórias. Os medicamentos que os pacientes utilizam não são de fácil acesso e muitas vezes não estão disponíveis levando os usuários a interromperem o tratamento, pois a maioria deles são importados. “São tratamentos dispendiosos nos quais os usuários do SUS não conseguem comprar, porque alguns deles como, por exemplo, os inibidores são importados, e só o setor público pode prover”, relata a estudiosa.
Perspectivas Futuras
No contexto atual acompanhando o cenário da ciência as pesquisadoras se encontram preocupadas com a continuação dos trabalhos, pois sem estudantes exclusivos, todo o funcionamento do laboratório não acontece. É neste momento que os apoios das agências de fomento têm se tornado fundamentais. Os estudos apoiados pela Fapeal empregam recursos acadêmicos, mas oportunizam propostas aplicadas a realidade local.
Para a cientista Jadriane Xavier, “a proposta da Fapeal desde o início dos trabalhos com o PPSUS dispunha de um pensamento em estudos que fossem de fato aplicados no SUS, existia esta preocupação. Assim a população consegue visualizar a pesquisa e o mais importante, a necessidade do emprego de recursos”, destaca a acadêmica.