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Estudo analisa os contextos da terminalidade e amparo no fim da vida

A pesquisa ganhou o prêmio de melhor pôster qualitativo da Cacun 2019

Tárcila Cabral

Carlos Adriano e Monique Albuquerque

Como lidar com a morte? Ou como ofertar qualidade de vida nos dias finais de um indivíduo? Essas são as proposições que uma pesquisa desenvolvida na Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) buscou elucidar, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal).

O Projeto de Iniciação Científica (Pibic) foi construído pelo professor de Bioética, Carlos Adriano, e a aluna de medicina, Monique Albuquerque, em análise intitulada “Terminalidade de vida e o ambiente pré-hospitalar”.

O estudo vem tratar do tema buscando assimilar a visão do atendimento médico pré-hospitalar, ou seja, daqueles que realizam os primeiros procedimentos no paciente. Os estudiosos analisaram o que estes profissionais entendem por morte e também sobre o estado terminal das doenças. Logo, o foco também se voltava a estudar como era compreendida a decisão sobre tentar reanimar pacientes ou não, em possível parada cardiorrespiratória.

Esta pesquisa foi desenvolvida no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), pois o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) pertence ao SUS.

Segundo o orientador, o mote seguido foi de questionar os limites das decisões médicas nesta atuação bioética. Para isto, cerca de 45 profissionais responderam a quatro perguntas. A primeira os indagava acerca do que é morte: “Esta é uma pergunta que pode parecer banal, mas observamos respostas de todos os âmbitos. Muito associadas a vínculos sociais, religiosos, contextos gerais e não tanto da formação crítica médica”, frisa o professor de Bioética.

A estudante completa citando que a maioria dos médicos ainda segue um contexto estritamente biológico. Foi constatado que eles entendem a morte como o final da vida, numa possível parada dos sinais vitais ou do sistema nervoso.

“Eu e meu orientador, por outro lado, já entendemos que existem várias significações para a morte. No conceito biológico, o que possuímos de crítica é a visualização do paciente apenas como uma estrutura fisiológica e, não como uma pessoa de estrutura subjetiva”, cita Monique Albuquerque.

Os estudiosos frisam que o indivíduo deve ser analisado também enquanto pessoa neste contexto. E aí os estudiosos realizam um segundo questionamento: Até onde vai o conceito de vida para um médico, diante deste quadro?

Atualmente o conceito da eutanásia não está contemplado dentro do código de ética do Conselho Federal de Medicina (CFM), mas está legalizado o direito de permitir ao paciente morrer de forma natural. Essa condição é a ortonásia, que é permitida no Brasil, possibilitando um tratamento paliativo no final da vida do indivíduo, o auxiliando a ter os cuidados de que necessita neste processo final.

Esta abordagem motiva inclusive a imersão do estudo no contexto das famílias, afinal, familiares são os responsáveis legais por deliberar junto aos médicos nestas situações.

O pesquisador atenta que hoje os pacientes não morrem mais em casa: eles terminam seus últimos dias nos hospitais, longe do amparo da família e do lar. Os hospitais, por sua vez, possuem restrições de horários e dificultam o acesso de pessoas para reforçar os cuidados, e mesmo que o indivíduo, por algum instante, recobre sua consciência, ele olhará para pessoas desconhecidas no quarto.

Estas situações são ilustradas pelo professor de Bioética para lembrar que, ainda assim, em qualquer contexto é importante garantir o melhor fim de vida possível para os pacientes, e isto pode significar falecer num processo natural, no alicerce da família.

Análise e reflexão da terminalidade

Os pesquisadores são da Uncisal

O último conteúdo analisado na construção do trabalho foi: Diante de um paciente terminal, que já havia deixado claro seu interesse de não ser reanimado, se ele sofre uma parada cardiorrespiratória e a família pede ao médico que o reanime, qual é a decisão deste profissional?

Esta é uma pergunta que impõe muitos conflitos à mentalidade médica, porque se dispormos o tema num patamar jurídico, o não fazer médico pode gerar penalidades. O questionário objetivou trazer, mesmo, esta quebra de paradigmas e, por ser tão conflitante, acabou gerando respostas um tanto discrepantes, cita a dupla de pesquisadores.

“Alguns profissionais pontuaram que deveria ser seguido o desejo da família por reanimar este paciente, mas outros entrevistados, a maioria, ainda avaliaram que a autonomia do paciente deveria ser respeitada, mesmo com todos os riscos”, alega a estudante.

Repercussão qualitativa e perspectivas futuras

A abordagem tem potencial de tornar-se um linha de pesquisa em si

A pesquisa ganhou o prêmio de melhor pôster qualitativo no Congresso Acadêmico da Uncisal (Cacun) de 2019, o que demonstrou a relevância do trabalho realizado.

“Este é um tema significativo, pouco trabalhado e muito necessário. Outra questão é o mérito da estudante: Monique pesquisou, entrevistou e trouxe sua experiência para captar uma ideia que não é fácil”, citou o professor Carlos Adriano.

Monique Albuquerque também destacou os esforços de seu orientador, que a guiou e trabalhou em conjunto numa linha de pesquisa complexa, com pouco acesso à bibliografia e no rumo de entrevistas laboriosas.

O intuito agora é disponibilizar a pesquisa em mais eventos acadêmicos e publicá-la em revistas científicas de referência, como o periódico do Conselho Federal de Medicina, a revista Bioética.

Além disso, a equipe já trabalha com uma devolutiva para a Universidade inserindo esta discussão na academia. Para o professor é necessário que a comunidade científica reflita esta linha de pesquisa e saiba que ela existe, até para compreender como se pode melhorar no tocante do tema. “Nós esperamos que o conteúdo contribua para uma mudança, proponha uma discussão. A Uncisal foi fundamental nesta estrutura da execução do projeto e forneceu todo o apoio ao trabalho”, frisa o estudioso.