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Revista: Presidente interino da Fapeal defende participação da sociedade na defesa da ciência e das Universidades

O papel da ciência no enfrentamento da pandemia e os 30 anos da Fundação também foram destaque na entrevista de João Vicente Lima ao projeto Ciseco Entrevistas

Deriky Pereira – jornalista

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“A gente precisa de informação para o público poder debater. Pra mim a questão da comunicação e da Comunicação Pública é uma causa que o cidadão deve tomar pra ele, ele deve fazer parte disso de uma forma mais ativa. É importante que a sociedade se posicione e defenda, não a postura ideológica de A ou B, mas que defenda a Universidade, a todos os sistemas de conhecimento das técnicas e que tudo isso seja muito cuidado com certos valores e princípios como tolerância, respeito mútuo.”

A frase acima foi dita pelo diretor-presidente interino da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal), professor João Vicente Lima, que defende uma participação mais incisiva da sociedade na defesa das Universidades e da ciência, durante participação no projeto Ciseco Entrevistas – iniciativa do Centro Internacional de Semiótica e Comunicação e apoiada institucionalmente pela Fapeal, para suprir a realização presencial do evento que, por conta da pandemia do novo coronavírus, precisou ser suspenso.

Para o professor, momentos como esse, proporcionado pelo projeto, também são importantes vetores de sensibilização aos atores políticos para evitar os cortes no financiamento reforçando a importância do conhecimento. Citando a existência do negacionismo que existe atualmente, ele destacou que a controvérsia sempre esteve presente no universo científico, mas que é preciso debater com respeito e tolerância.

“A gente precisa sensibilizar os atores políticos em todos os níveis sobre a importância do conhecimento. Só que isso não é fácil. A gente vive um momento difícil que muitos chamam de negacionismo. É preciso reverter isso e fugir de certo debate muito simplificador da postura A ou B. Não se trata disso. O cientista aprende desde cedo que a controvérsia é coisa boa no processo todo de aperfeiçoamento dos sistemas de conhecimento. É importante que a sociedade se posicione e defenda, não a postura ideológica de A ou B, mas defenda a Universidade, a todos os sistemas de conhecimento das técnicas e que tudo isso seja muito cuidado com certos valores e princípios como tolerância, respeito mútuo. O debate científico que a Universidade propõe e que a Fapeal apoia é esse”, frisou.

O diretor-presidente interino classificou como preocupante as informações construídas intencionalmente e lançadas para conduzir comportamentos e posturas. Ele defendeu a importância da argumentação para chegarem em pontos de tangência e convergência e, assim, estabelecer um diálogo racional, diferente do que defendem os criadores e disseminadores dessas notícias falsas.

“Quando você tem um satélite mandando informações de que aconteceu o aumento da queimada e vem a autoridade dizendo que não houve isso é alarmante. A gente simplesmente está negando uma realidade que deveríamos discutir a partir dela. A gente precisa de informação para o público poder debater. Acho que a mídia é muito responsável por tudo isso também. As fake news e os atores mal-intencionados querem exatamente isso: destruir as bases do debate racional, da busca dos níveis razoáveis de convergência sobre as coisas pra deixar a sociedade e o cidadão refém de um modus operandi conhecido”, refletiu.

João Vicente também elogiou o trabalho da comunicação da Fapeal que, para ele, atinge a comunidade científica e também passa sua mensagem para todos os públicos. No entanto, ele acredita que a questão da comunicação deve contar com a participação do cidadão cada vez mais de forma ativa: “Pra mim, a questão da comunicação e da Comunicação Pública é uma causa que o cidadão deve tomar pra ele, ele deve fazer parte disso de uma forma mais ativa. A Fapeal, com uma pequena equipe, muito corajosa, tem um alcance, uma extensão e uma profundidade da nossa capacidade de participar desse debate defendendo a ciência e o cientista. A questão da comunicação deve, digamos, organizar a própria mentalidade do sujeito, do cidadão, na hora de ele pensar como vai participar das soluções do mundo, a começar da comunidade dele”, apontou.

Durante quase 40 minutos, o professor conversou com a também docente da Universidade Federal de Alagoas, Manoella Neves, sobre o papel da ciência no enfrentamento da pandemia, as três décadas da Fapeal – classificadas por ele como uma história linda – e sua importância para a comunidade científica do estado e defendeu o trabalho interdisciplinar que se mostrou, em sua opinião, determinante no processo de enfrentamento ao novo coronavírus. Reforçou ainda que o Governo de Alagoas reforçou os investimentos em Ciência e Tecnologia desde 2015 e se mostra favorável para o orçamento de 2021.

A ciência e o enfrentamento da pandemia

Durante a conversa, Manoella Neves apontou que os olhos do mundo se voltaram para a pandemia do novo coronavírus, inclusive na questão da ciência, mas questionou João Vicente sobre quais áreas ele acredita que poderiam ser mais valorizadas com políticas públicas de financiamento.

“A gente sabe que alguns equipamentos que foram feitos, estavam a disposição, demandaram primeiro que o corpo da saúde pudesse estabelecer os parâmetros de funcionamento, mas várias outras competências como engenheiros, computação, de várias áreas estavam imersos na tentativa de buscar uma solução que se adequasse mais a nossa realidade financeira. Então, o fenômeno Covid deu pra gente, mais do que nunca, um exemplo fortíssimo da importância do trabalho interdisciplinar. É um desafio que exige o trabalho em rede de várias competências técnicas e a gente se dá conta da necessidade do financiamento”, disse ele.

João Vicente comentou ainda a frase do presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich que, em agosto passado, apontou que “Nunca na história se aprendeu e se produziu tanto” com relação ao aumento de produção científica em função da pandemia. Para ele, a Covid_19 criou sensibilização no mundo e tal esforço fez com que os estados nacionais se esforçassem ao ponto de otimizar tempo, recursos e pessoal técnico. No entanto, ele reforça que, mesmo assim, os estados ainda carecem de mais fomento à pesquisa.

“Hoje temos mais de 100 vacinas sendo feitas no mundo porque todo país sabe que deve trabalhar pra ter sua autoproteção. E ao mesmo tempo tem uma série de iniciativas que são globais. Somos capazes de responder assim, mas não quer dizer que tenhamos os recursos necessários. O que ele [Davidovich] diz é que a gente teve que dar prioridade e buscou recursos para poder prover competências técnicas para que nossos colegas pudessem colocar em prática seus conhecimentos e buscar soluções”, salientou João Vicente.

A luta contra o corte de recursos para a ciência

Os docentes também falaram sobre a sombra do corte de recursos que vem atingindo a ciência brasileira. João Vicente explicou que o que acontece em Alagoas também ocorre em boa medida, no país inteiro, mas que a Fapeal vem lutando para cumprir seu papel diariamente.

“Quase ¾ de todo recurso que custeia e financia a comunidade de conhecimento de Alagoas vinha das agências federais como CNPq, Capes, Finep e como a gente vive uma crise sem precedentes num processo muito severo de desfinanciamento da ciência no Brasil que tem diminuído os aportes. Isso resulta numa sobrecarga enorme para os ombros da Fapeal. É uma realidade de Alagoas, do Brasil, tem sido delicado, mas a gente vai tentando desviar dos obstáculos e fazer com que a Fundação cumpra sua finalidade”, contou.

Perguntado sobre o que a comunidade científica alagoana poderia esperar do ano de 2021, o diretor-presidente interino se referiu a uma música do cantor Cartola – que não se recordou no momento da entrevista – chamada “O mundo é um moinho” ao dizer que ainda era cedo pra dizer como seria.

“A fundação, como órgão do estado de Alagoas, sofre com as dificuldades que o estado passa, mas de 2015 pra cá, o governador cumpriu tudo que combinou inicialmente. Mas sabemos que o orçamento não poderá ser menor do que o deste ano, então isso já nos dá um certo ânimo. Na assembleia houve esse acordo com o governador [Renan Filho] e ele acolheu bem isso, tem se mostrado um apoiador da ciência. Vamos partir de um patamar razoável, só que a gente precisa de mais e vamos correr atrás de mais recursos”, salientou.

Confira a entrevista na íntegra: